Lily Rabe está fazendo algo que raramente faz quando atua em peças ou filmes: está convidando pessoalmente amigos e familiares para assistirem à sua atuação no Lincoln Center. Lá, ela protagoniza uma aclamada remontagem de Ghosts, de Henrik Ibsen, entregando uma verdadeira aula sobre luto e culpa todas as noites. “Peças teatrais são efêmeras. Quando acabam, desaparecem”, reflete Rabe. “Dessa vez, não estou deixando nada ao acaso. Sei que todos têm vidas ocupadas, e não quero ser incômoda pedindo que vejam meu trabalho. Mas não se trata de mim — quero que as pessoas assistam a esta produção porque ela parece essencial neste momento.”
Rabe e seu marido, Hamish Linklater — que também integra o elenco — conversam em uma sala de ensaio simples no subsolo do Lincoln Center Theatre, horas antes da apresentação de sexta-feira. Ambos desconheciam Ghosts, que não tem a mesma fama de Casa de Bonecas ou Hedda Gabler, de Ibsen, mas se surpreenderam com a atualidade da trama, apesar de seu cenário do século XIX. A peça acompanha a viúva rica Helen Alving, que planeja inaugurar um orfanato em homenagem ao falecido marido. A ocasião traz seu filho, Oswald, de volta ao lar após uma década longe. Em um único dia e noite intensos, a família Alving é confrontada com segredos enterrados há muito tempo — segredos que afetam diretamente a saúde de Oswald.
Sem revelar demais, essa premissa aparentemente simples serve para Ibsen explorar temas como hipocrisia religiosa, machismo e desigualdade social. Rabe sentiu que a personagem de Helen — uma leitora ávida, constantemente subjugada ou questionada pelos homens ao seu redor, incluindo um pastor desajeitado (Billy Crudup) e um carpinteiro moralmente ambíguo (Linklater) — ecoa em um momento em que os direitos das mulheres estão sob ataque nos EUA. A montagem foi planejada antes da volta de Trump ao poder, mas o casal vê Ghosts como um alerta sobre a turbulência política atual. “Queria que estivéssemos encenando isso em outras circunstâncias, mas, dadas as condições, estou feliz por estarmos fazendo esta peça”, diz Rabe.
Linklater complementa: “Há aquela frase sobre ‘fazer um barulho alegre’, não é? Precisamos unir as pessoas e mostrar que suas vozes importam. Sempre foi o papel da arte, mas especialmente agora, quando todos estão entorpecidos pelo sentimento de desilusão. Queremos lembrar que é possível tornar o mundo um lugar melhor outra vez.”
A peça também reacendeu no casal — que se conheceu em O Mercador de Veneza, em 2010 — o amor pelo teatro. Ambos têm carreiras sólidas no cinema e na TV (ela no universo de American Horror Story, de Ryan Murphy; ele como ator de personagens, tendo interpretado desde Abraham Lincoln até Jeb Magruder), mas a demanda os afastou dos palcos. Rabe não atuava no teatro há dez anos; Linklater, desde 2019. “Sabia que sentia falta, mas, como acontece quando algo faz muita falta, você tenta bloquear esse desejo porque dói lembrar”, admite Rabe. “Voltar agora, com esta peça em especial, me fez perceber que precisava disso mais do que eu mesma admitia. Nunca mais quero ficar tanto tempo longe.”
Linklater concorda: atuar para as câmeras tem suas recompensas, mas não exige o mesmo esforço integral. “É maravilhoso ir para casa esvaziado”, diz ele. “No teatro, você dá tudo: energia, suor, alma. No cinema, o foco é capturar um momento específico. No palco, você se esgota, se expõe por completo — e no fim, sente que fez um trabalho honesto.”
A montagem também reuniu o casal com Jack O’Brien, que os dirigiu em Muito Barulho por Nada (2014) no Shakespeare in the Park. “Lily e Jack são melhores amigos secretos e ficam se chamando de ‘Marco Polo’ o dia todo”, brinca Linklater. Foi O’Brien quem decidiu eliminar o intervalo, mantendo a peça em um ato contínuo de duas horas — uma escolha apoiada por Rabe, mesmo que isso signifique percorrer a jornada trágica de Helen Alving, da tranquilidade ao caos, sem pausa. “Agradeço por não termos intervalo”, diz ela. “No final, há um silêncio no teatro, como se todos tivessem vivido algo íntimo. Um intervalo quebraria esse ritmo. E eu nem sei o que faria com 15 minutos de pausa — uma vez em cena, não quero sair.”
Ghosts não é uma peça leve. É uma história sombria, onde a virtude não é recompensada, mas esmagada. Mesmo assim, Linklater acredita que abordar temas como incesto e eutanásia pode ser catártico. “Teve uma matinê em que uma senhora virou para a amiga e disse: ‘Foi tão triste. Não foi maravilhoso?'”, conta ele. “As pessoas saem tocadas. Gostam de ser convidadas a embarcar nessa jornada conosco.”
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Este artigo foi inspirado no original disponível em variety.com
POLÍTICA INFLUENCIA A ARTE?
SIM