O renomado cineasta iraniano dissidente Jafar Panahi subiu, nesta terça-feira, os degraus do tapete vermelho do Festival de Cannes para a estreia mundial de seu novo filme, “It Was Just an Accident”, rodado clandestinamente no Irã. O momento é histórico, marcando o retorno de Panahi após 14 anos de proibição de dirigir filmes, conceder entrevistas e viajar para o exterior. Conhecido por obras premiadas como “O Círculo”, “Offside”, “Isto Não É um Filme”, “Táxi” e, mais recentemente, “No Bears”, Panahi foi preso em 2023 durante o endurecimento do regime conservador iraniano e cumpriu quase sete meses de prisão sob acusações de “propaganda contra o sistema”. Sua proibição foi suspensa pelo governo em abril de 2023.
A presença de Panahi em Cannes parece ser um sinal de que o Irã está, ao menos superficialmente, mudando sua postura em meio às crescentes tensões após a morte de Mahsa Amini, jovem de 22 anos que morreu sob custódia policial em setembro de 2022 por supostamente usar o hijab de forma “inadequada”. “It Was Just an Accident”, filmado sem autorização no Irã, mostra mulheres sem o véu islâmico, refletindo a rebelião generalizada contra a lei que obriga o uso do hijab no país. Em contraste, as mulheres em “Woman and Child”, de Saeed Roustayee, aparecem todas cobertas.
O longa de Roustayee, que estreia em Cannes nesta quinta-feira com o diretor presente, é uma continuação de “Leila’s Brothers”, exibido no festival em 2022. A escolha por retratar mulheres usando o hijab rendeu críticas a Roustayee dentro da indústria cinematográfica iraniana, com acusações de que ele estaria se alinhando ao governo. O cineasta, que em 2023 foi condenado a seis meses de prisão por exibir “Leila’s Brothers” em Cannes (mas não cumpriu a pena), nega veementemente essas alegações.
Recentemente, Roustayee recebeu apoio público do também diretor iraniano Mohammad Rasoulof, que fugiu para a Europa em maio de 2024 após ser condenado pela justiça do Irã por seu filme “A Semente da Figueira Sagrada”, exibido em Cannes no ano passado. Em declaração à Variety, Roustayee explicou: “Meu quarto filme é sobre uma mulher que enfrenta todos os homens à sua volta e uma sociedade patriarcal que a priva de seus direitos, inclusive o de ser mãe. O hijab não é minha escolha, mas faz parte da vida no Irã. É uma lei imposta às mulheres, mas nós aprendemos a resistir por dentro, pela liberdade.”
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Este artigo foi inspirado no original disponível em variety.com