As altas tarifas anunciadas pelo presidente Donald Trump nesta quarta-feira não devem impactar diretamente os custos da maioria das empresas de mídia e entretenimento. No entanto, os efeitos indiretos — como a redução no consumo das famílias americanas e cortes em orçamentos publicitários — podem afetar significativamente os lucros de Hollywood, segundo analistas. O temor de que as novas tarifas desencadeiem uma recessão já se refletiu na queda generalizada do mercado de ações nesta quinta-feira.
Matthew Dolgin, analista sênior da Morningstar, destacou em um relatório que as tarifas “recíprocas” de Trump “não causarão danos diretos” ao setor de mídia e entretenimento. Exceto por empresas como Apple e Roku, que dependem da venda de hardware para uma parte relevante de sua receita, a maioria das companhias do ramo “não está diretamente exposta a esse tipo de cobrança”. No entanto, Dolgin alerta: “Como muitas delas dependem do consumo das famílias, uma desaceleração econômica provocada pelas tarifas pode prejudicar seus negócios”.
CJ Banagh, especialista da PwC em telecomunicações, mídia e tecnologia, explica que os custos das tarifas serão repassados aos consumidores, elevando preços. E, em tempos de aperto, “o entretenimento e a mídia estão entre os primeiros gastos que as famílias cortam”. Além disso, uma recessão levaria a reduções nos investimentos em publicidade — um dos pilares financeiros do setor. Para Banagh, isso representaria um “golpe duplo” para Hollywood, pressionada tanto pela queda no consumo quanto na verba de anunciantes.
Diante desse cenário, a especialista recomenda: “Nunca comprometa a qualidade do conteúdo ou a experiência do consumidor”, mas seja estratégico na otimização de custos. “Empresas que mantêm investimentos em marketing durante crises se saem melhor no longo prazo”, reforça.
Outro possível efeito colateral está no sentimento do público europeu. Maggie Switek, economista do Milken Institute, observa que as tensões comerciais e a postura dos EUA em conflitos internacionais podem influenciar a percepção sobre filmes e produtos culturais americanos na Europa. “Ainda é cedo para medir o impacto, mas monitorar essas mudanças será crucial para entender os desafios futuros de Hollywood”, afirma.
Mesmo antes do anúncio das tarifas, a confiança do consumidor americano já mostrava sinais de desgaste, com o índice do The Conference Board registrando queda pelo quarto mês consecutivo. A medida de Trump, segundo Switek, “adiciona mais incerteza ao mercado, o que deve se refletir no humor dos consumidores”.
Entre as ações mais afetadas estão Disney (-9,3%), Warner Bros. Discovery (-13,3%), Live Nation (-6,4%) e Roku (-15,6%), em um dia marcado por quedas acentuadas no S&P 500 (-4,84%) e Nasdaq (-5,97%). Dolgin destaca que os parques da Disney — sua principal fonte de lucro — sofreriam com a redução do turismo em uma recessão, especialmente de visitantes internacionais. A Live Nation também enfrentaria riscos, já que shows são um gasto dispensável em tempos difíceis. Por outro lado, o crescimento do streaming poderia compensar parte das perdas da Disney.
No caso da Roku, embora seus dispositivos sejam fabricados na China e em outros países afetados pelas tarifas, seu modelo de negócios depende mais de publicidade e parcerias — áreas não impactadas diretamente pelas medidas. Ainda assim, cortes em anúncios representariam um risco.
O setor de eletrônicos, porém, será um dos mais atingidos. Gary Shapiro, da Consumer Technology Association, criticou duramente o plano tarifário: “Essas medidas são um aumento de impostos disfarçado, que elevará a inflação, destruirá empregos e pode levar à recessão”. Ele comparou a política ao desastroso protecionismo dos anos 1930, alertando: “Os americanos mais pobres serão os mais prejudicados, e os políticos colherão as consequências”.
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Este artigo foi inspirado no original disponível em variety.com